Vizinhos são a segunda família - disse a Dona Maura quando saí da casa dos meus pais e instalei-me em Porto Alegre. Falava isso para encorajar-me a fazer amizade com os outros moradores do prédio, que hoje vejo, era um cortiço.
De paredes finas e janelas que davam para os outros apartamentos, eu poderia refilmar Janela Indiscreta. Poderia acompanhar a vida solitária de uma mulher maníaca por limpeza, que eventualmente gritava pela janela. Sem coragem de bater na porta do próximo, ela gritou comigo, com um cachorro, com os donos do cachorro, entre outros urros. Mas não era eu ter o poder de acompanhar a vida de alguém que me incomodava. Além da solitária, havia a síndica que, morando abaixo da minha casa, escutava tudo, absolutamente t-u-d-o o que eu fazia, sem evitar comentar comigo ou outros os fatos. Passei um ano naquele endereço, só para não pagar multa de recisão contratual, tão grande era a minha afeição por aquela senhora de aproximadamente 60 anos, cabelos curtos e cigarro na boca.
O segundo endereço foi a paz. Paredes mais grossas, janelas para áreas arborizadas, elevador para evitar alguns encontros e vizinhos que tinham uma vida muito ativa. Viajavm por seis meses, iam fazer curso em Brasília, se mudavam e não vendiam o imóvel, etc e tal. Ainda assim, como eram 4 apartamentos por andar, eu tinha outra senhora com quem dividir alguns contratempos. Dona L., estou sem açúcar. Ou Dona L. tem uma pilha dessas de por no aquecedor, a minha acabou. E assim ela me salvou de algumas infelicidades.
Mas este terceiro endereço faz aos poucos o meu e o sangue das gurias ferver. Primeiro foi o barulho constante dos carros, depois os gritos do Gabriel-bem-cuidado!, mais tarde as marteladas da reforma inacabável sobre as nossas cabeças e, enfim, um cão maldito de unhas cumpridas que corre por todos os lados na parte da manhã.
Ainda assim, hoje houve a superação. Um cocô canino apareceu no peitoril da sacada que divido com a Ana Lu! Adivinha de quem é?
De quem tem vizinhos cu.
ps: já tem até mosca.
